segunda-feira, 27 de abril de 2015

No bairro nobre

Um dia parou o carro naquela rua do bairro nobre para matar uma curiosidade de anos. Entrou na porta aberta da minúscula e velha mercearia. Pediu um quilo de café. A atendente era uma senhora de quase 80 anos, cabelos brancos desgrenhados, vestido colorido, poucos dentes na boca. Mesmo assim ela sorriu e ele fez o pedido. Ela disse que ia verificar se tinha ou não. Ele olhou as prateleiras quase vazias, o balcão do tempo em que Ney Braga era capitão do Exército, as várias garrafas de cachaça barata se destacando na paisagem. Ela disse que trabalhava ali há meio século, desde o tempo em que só existia mato só em volta - e o povo era pobre e comprava para pagar no final do mês o que foi anotado na caderneta. O marido morreu, ela ficou com o comércio e a casinha dos fundos, separada daquele espaço apenas por uma porta atrás de uma cortina surrada. Ele pagou o último pacote de café que ali existia e perguntou se ela abria a venda todos os dias. Ela respondeu que sim, porque era a única diversão da sua vida . Disse também que ficava sempre feliz quando os aposentados entravam ali para beber e jogar conversa fora. Revelou, porém, que um por um foram morrendo. Ele ficou triste por ela, mas feliz por finalmente conhecer um pouco da história daquele pedaço da cidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário