segunda-feira, 11 de abril de 2016
A revolução no cabo da brocha
Seu sonho era ser pintor. Conseguiu. Pintor de parede razoável, um dia recebeu a encomenda de lambuzar o muro da casa do padre. Um milagre em sua cabeça aconteceu. Passou a falar para todo mundo que era restaurador de prédios tombados pelo patrimônio histórico. Alguém desconfiou e foi verificar sua história. Não conhecia o pai. A mãe foi criada em casa mal falada durante a exuberância do ciclo do café. Ele enveredou pela política para enterrar o passado, mas apenas seguiu o que os outros falavam. Se entusiasmou com as revoluções, qualquer uma, desde que se fuzilassem, saqueassem e roubassem em nome dos fracos e oprimidos. Ditaduras só haviam de um tipo, a do lado direito de quem enxerga estrabicamente. O tempo passou, mas ele não. Continuou pintando e caiando paredes e idolatrando malucos que batiam no peito com uma mão e roubavam os cofres públicos com a outra. Tudo justificável. Até o dia em que, já com idade avançada, despencou da escada e foi penetrado pelo cabo de uma brocha que o esperava embaixo. Levado ao hospital, foi submetido a uma cirurgia que o deixou folé para sempre. O que enfermeiros e médicos não entenderam é que antes, durante e depois da cirurgia, o paciente balbuciava: "Viva a revolução! Viva a revolução!"
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