quarta-feira, 20 de abril de 2016

Estanhado

Estanhou os olhos... Será que ouvi, li ou sonhei com isso? Mas ao lembrar, olhei para o lado. A foto minha e dele é como dois seres externando mundos diferentes. Pelo olhar. O dele estanhou na hora que o diafragma da máquina se abriu para o registro na película? Deste instante em diante, sendo ou não isso, fiquei sob a mira. E gosto porque, no rosto vincado, fechado, não há raiva, não há delírio, nem estado possesso. Enquanto escrevo ele me olha e agora vejo alguém apenas fechado, mas passando o gostar represado que não conseguiu externar. Quase encostei meu rosto no dele para este momento de um passado que é presente e futuro. Sorri em contraste com a boca fechada ao meu lado, como uma carteira de dinheiro, igual àquela que ele não abria na minha frente quando precisava dar algum. Virava-se de costas, tirava a quantia e depois entregava - com o rosto desse jeito de sempre, os cantos da boca descendo um pouco no fim da linha traçada pela junção dos lábios. Agora procuro na memória uma situação com alguém de olho estanhado de verdade. E só encontrei a mim mesmo, olhando-me no espelho antes de o metal derreter e produzir lágrimas. 

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