segunda-feira, 16 de março de 2015
O anjinho
O anjinho nunca lhe saiu da cabeça. Não lembra das feições, mas era um bebê que chorava muito lá no fundo do ônibus. Ele viu também a mãe tirar o peito murcho para lhe dar leite, enquanto se servia de um pedaço de frango com farinha que ela e o marido tinham trazido para comer durante a longa viagem do sertão nordestino para São Paulo. No terceiro dia, o choro parou. Ele, que era uma criança um pouco maior, de nove anos, viu o motorista entrar com o ônibus numa cidadezinha para conversar com algumas pessoas. O anjinho foi deixado lá, para ser enterrado - porque a viagem tinha de continuar para aquela meia centena de passageiros. Os pais não choraram nem se lamentaram. Talvez aquilo fosse comum no lugar de onde vinham. Na rodoviária da cidade grande o menino acompanhou os dois carregando as trouxas mulambentas no meio da multidão. Era tudo o que tinham - além do anjinho que ficou sozinho no meio do Brasil.
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