segunda-feira, 9 de março de 2015

Sem palavras

Ele dominava o cavalo como se quisesse mostrar para o que era, lá no fundo que eu não conhecia - o que tinha ficado para sempre dos tempos em que viveu ali naquele pedaço de terra nos confins. Sentado na soleira da porta eu apenas olhava e ali estava a revelação do meu grande herói. O cavalo era muito mais bonito do que o do Ivanhoé do seriado que eu via na terra sem graça e distante. Terra cinza, sem árvores, onde ele era apenas um operário a cumprir a jornada diária da sobrevivência e a comer a marmita sempre esquentada na água do banho-maria. Espinha ereta, ia e vinha na estradinha de terra e areia. Cavalo na passada, como se estivesse numa passarela. E quando quando o senhor resolvia frear, as patas dianteiras do animal estancavam, escorregavam, levantavam poeira e o focinho baixava quase a tocar no chão. Depois o corpo se virava ao comando dos arreios e o percurso em linha reta era vencido como se o animal e seu dono flutuassem para meus olhos. Depois de algum tempo tudo terminou. Ele apeou da cela e entrou na casa sem dizer nada, como sempre fez e faria por muito tempo. Meu pai não precisava falar.

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