quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Primeira comunhão

O diploma da primeira comunhão ele tinha guardado.  anjo da guarda estava lá, cabelos compridos, bonito feito galã de cinema americano. Asas enormes, protegendo o casal de crianças num caminho dos sonhos. Muitos anos depois, adulto, descobriu o complemento. A mãe tinha guardado a vela comprida que ele segurou acesa na igreja da vila. Ela tinha quebrado, mas valia. O quê, ele não sabia. A foto feita depois num pequeno estúdio também estava guardada. Ajoelhado, olhar fixo naquela imagem em tamanho natural do senhor que lhe estendia a hóstia consagrada, paletó fornecido pelo japonês do clique, imagem retocada. Jesus Cristo lhe dando o passaporte para caminhar direto para o céu dali a um tempo que ninguém sabia. Só Deus. Não mastigue a hóstia de jeito nenhum! A recomendação era essa. Pode sair sangue. Ela grudou no céu da boca e demorou a dissolver. Pensava nisso tudo enquanto montava a Walter PPK que lhe permitia exercer há muito tempo a profissão. Matador profissional. Dali algumas horas tinha mais um serviço encomendado a cumprir. Fez tudo como sempre. Se aproximou há um bom tempo da vítima, ganhou confiança e, na hora, o tiro seria dado no meio da testa. Antes, cumpria o ritual de perguntar se o futuro defunto tinha feito primeira comunhão. Quando recebia um sim como resposta, não ficava com remorso. Quando era um não, continuava impassível - e dizia: "Azar o seu".

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