quarta-feira, 18 de junho de 2014

Na penitenciária

Ficou diante do assassino e não sentiu nem um pingo de medo. Certo que estavam numa sala da penitenciária e ele tinha oficializado um pedido para conversar com o preso mais antigo dali. O encontro demorou, mas aconteceu. O homem tinha aparência de um trabalhador da roça curtido pelo sol, rosto seco e vincado, magrinho, baixinho, bigode bem cuidado. Estava ali há 20 anos e jurou inocência de tudo o que aparecia em sua folha corrida. Se estivesse sentado num banco de praça e conversando, não daria o mínimo sinal de ser um psicopata sanguinário que até criancinhas de colo tinha estripado. Era sua especialidade. Usava sempre faca de açougueiro, pois no passado trabalhou retalhando carne de bichos. O assassino não olhava nos olhos, talvez com medo de se entregar. Contou sem dor que ficaria ali até o fim da vida - e disse não temer ser morto lá dentro. Revelou ser protegido. Então o homem que foi ali conversar com ele para um trabalho acadêmico perguntou qual era a proteção que ele tanto confiava. Exu, disse o preso. E soltou uma gargalhada tão assustadora que uma vaca mugiu alucinada longe dali, um peixe se engasgou com a água e a roseira de uma dona de casa secou de repente. O sinal da cruz do visitante encerrou a conversa.

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