terça-feira, 21 de outubro de 2014

Divorciado da realidade

Andava meio perdido na calçada e se deu conta de que a porta da igreja estava aberta. Parou. Viu então o padre de barbas longas e corcunda acentuada. Pensou que era uma benção divina. Perguntou se poderia se confessar. Não fazia isso há décadas. O velhinho olhou para ele e quis saber seu estado civil. Ele tinha perdido a conta de casamentos desfeitos, mas lembrou que, oficialmente, havia um papel que o carimbava oficialmente como divorciado. Era assim que preenchia aquelas papeladas que pedem este tipo de informação. O padre disse que ele não poderia contar os pecados, muito menos comungar no dia seguinte. Lei da igreja. Ele perguntou se, por causa disso, iria queimar eternamente no inferno, já que vivia em outro aqui na Terra. O padre não gostou da pergunta - virou as costas e sumiu na escuridão da nave. Ele ficou parado ali, sob o sol, e imaginou outra cena. Nela dizia ao sacerdote que, sim, era casado no Civil e na igreja; entraria para contar os pecados e o primeiro seria o da mentira. Tinha mentido para poder confessar. Começou a rir da situação e descobriu que o cinza sumira da alma. Sorrindo, entrou numa padaria e comprou um sorvete. Chicabom.

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