quinta-feira, 4 de dezembro de 2014
Depois de Orlando Dias
Sempre foi macaca de auditório. O termo seria mais politicamente incorreto se ele dissesse que era macaco de auditório. Ninguém iria entender nos tempos de hoje. Mas ele era isso mesmo. Frequentava os auditórios das rádios que tinham programas ao vivo. Concorria com as mulheres, alucinadas, que gostavam de rasgar as roupas dos cantores. Um dia guardou seu maior troféu: o lencinho que Orlando Dias tirava do bolsinho do paletó ao final das interpretações e agitava para a platéia dizendo "Obrigado minhas fãs!" Ele era "o" fã, mas entendia a generalização. O tempo passou, os programas e os artistas foram para o vinagre - e ele baixou o fogo passando o dia todo de pijama em casa, mas sempre relembrando aquele passado cada dia mais passado. Até que um dia esqueceu tudo por causa de uma mulher. Artista, claro. Nunca a chamou pelo nome, apenas pelo personagem daquele filme: Malena. Soube que ela, italiana, veio morar no Rio de Janeiro. Foi atrás. Descobriu o endereço. Um dia a viu de longe e ficou contente. Teve medo de chegar perto, apesar de Malena estar tranquilamente fazendo compras num mercadinho. Mas voltou de lá com uma recordação. Conseguiu o capacho da entrada da casa. Agora tinha o lencinho do cantor e o capacho dela. Este ficava ao lado da cama. Antes de dormir, como num ritual, ele o abraçava e cheirava. Então, de olhos fechados, via a personagem andando por uma calçada a beira-mar. Sussurrava o nome e só então dormia em paz.
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