domingo, 31 de maio de 2015
quinta-feira, 28 de maio de 2015
Solta o gás!
Não tinha nada de "Invasões Bárbaras", aquele filmaço. Aos 67 anos ele estava cansado da vida e, ao contrário do professor, nada de doença terminal. Viver era um saco para ele. Não via mais sentido em nada, mesmo porque tinha sido um inútil durante toda a existência, apesar de cumprir o script de estudar, se formar, ganhar dinheiro, casar, ter filhos, etc. Queria a eutanásia, mesmo estando com a saúde em dia, conforme os exames que fazia de seis em seis meses. Suicídio? Nem pensar. Não tinha coragem. Chamou os filhos, todos adultos, formados, casados, etc. A mulher deixou de fora, porque pensaria que ele tinha pirado e pediria o internamento imediato. Revelou o caso para os herdeiros, arrematou mostrando o testamento e a divisão da fortuna - imaginando que isso iria incentiva-los. O mais inteligente não só concordou como fez graça, dizendo que, longe dele, todos se reuniam para assistir "Parente é Serpente" e estudavam uma forma de mandá-lo para a caixa prego. Ele riu muito e perguntou, então, qual seria o melhor método. Estava descartada a hipótese da dose cavalar de morfina, mesmo porque ele odiava ser espetado. Alguém sugeriu gás. Ele gostou e lembrou da piada do português que foi condenado à morte e, ao entrar na câmara, notou que havia uma abertura lá em cima, a muitos metros de altura. Ficou sossegado porque o gás sairia por lá e, amarrado a uma cadeira, ouviu alguém gritar "solta o gás"; olhar para cima, então, viu dois gajos largando um botijão em sua direção. Todos caíram numa gargalhada sem fim. Quando a coisa passou, com lágrimas nos olhos, o velho disse para que esquecessem tudo - queria continuar vivendo.
quarta-feira, 27 de maio de 2015
Viagem
De Nelson Capucho
Vida veloz,
vida fugaz.
Um túnel à frente,
Um trem atrás.
Um trem-bala japonês.
Perseguição à Diamba
O Fusca passou no sentido contrário e deu para ver que os dois ocupantes fumavam um baseado. Maconha!! Os do Fusca do lado de cá arregalaram os olhos. Um deles colocou a mão na cintura, sentiu o 38 que surrupiara do pai e ordenou ao outro: vamos atrás para dar uma geral. A manobra a seguir foi arriscada, mas eles saíram em disparada. Na perseguição combinaram: dariam um susto, pegariam a mercadoria e, depois, na ampla sala da casa do que estava dirigindo, fumariam tranquilamente enquanto na vitrola mais uma vez o disco da vaca ou do prisma os levaria para a viagem sonora. Numa vacilada perderam de vista o carro perseguido. Frustrados, foram para a mansão e não ouviram disco nenhum, mesmo porque estavam sem bagulho algum para o ritual. Enquanto isso, não muito longe dali, no outro carro, os dois riam do que acontecera. Pelo retrovisor viram que estavam sendo perseguidos, mas a cara dos dois guris não inspirava receio. Acharam que não eram policiais - e se fossem, concordaram, o tiroteio ia ser cinematográfico. Estavam armados com duas calibre 12 de repetição entupidas de balas. Era preciso tal arsenal, afinal, a missão era proteger a carga de alguns quilos da diamba que tinham de entregar naquela noite.
terça-feira, 26 de maio de 2015
descascando cebola
De Roberto Prado
dentro do dentro
no meio do miolo
nas profundas do centro
do núcleo de tudo
é ali, no fundo, no fundo,
que habita você
minhalma doutro mundo
dentro do dentro
no meio do miolo
nas profundas do centro
do núcleo de tudo
é ali, no fundo, no fundo,
que habita você
minhalma doutro mundo
Um lugar escuro
Tinha um lugar escuro. E todas as crianças da turma da rua eram atraídos por ele. Ficava numa casa de fundos, meia-água, sem iluminação, insalubre. Nenhuma família parava ali. Teve os baianos, com cachorro e tudo. Teve os japoneses cujo patriarca tomava banho no ofurô no quintal. A casa, contudo, normalmente ficava vazia - e, por algum motivo, com a porta principal aberta. Todos morriam de medo, mas se sempre se juntavam e entravam, devagar, para verificar. Nunca havia nada, nenhum móvel deixado, apenas o piso de cimento cinza congelando a alma medrosa e quase nada de luz natural. O máximo era entrar até onde era o quarto, depois de subir três lances de degraus. O grupo sempre ficava pouco ali dentro e, invariavelmente, alguém gritava ter visto um fantasma. Então saíam na correria para a rua, para os terrenos baldios, para o mato que parecia floresta - e a vida se transformava numa brincadeira iluminada. Mas era preciso entrar naquela casa, porque ali era era lugar escuro.
segunda-feira, 25 de maio de 2015
Na minha a tua ferida
De Paulo Leminski
Essa é a vida
que eu quero, querida
encostar na minha
a tua ferida.
Uma lagosta para Bukowski
Ninguém sabe como aquela lagosta apareceu. Os três tinham bebido muito na noite anterior. Fizeram a famosa via sacra por vários bares da cidade - que terminou no boteco onde o trio sempre entrava torto e pedindo para o conjunto musical tocar Summertime. Quando acordaram na casa de um deles, mais amarrotados do que pobre no trem da Central do Brasil, viram o embrulho em cima da mesa. Dentro do jornal que anunciava mais um crime bárbaro na cidade, o bicho, inteiro, pálido, se é que lagosta fica assim - mas aquela estava sem cor, pálida. Se entreolharam e um deles disse que sabia preparar. Às onze da manhã de um dia normal da semana, derrubaram algumas doses de cachaça, para rebater, e o crustáceo foi para a panela cercado de batatas e cebolas boiando em água com muito sal. Cervejas foram compradas, um litro de conhaque de alcatrão de São João da Barra também. Tomaram tudo. A água secou, o bicho e os ingredientes torraram um pouco menos que o trio. Quase houve um incêndio na casa de madeira. Eles acordaram antes da tragédia e resolveram comer do jeito que estava. Um quase morreu engasgado. Dormiram de novo. No dia seguinte queriam ir a um restaurante para saber que gosto tem uma lagosta. Não foram por falta de numerário. Aquele era um tempo em que reverenciavam Henry Chinaski, famoso personagem e alter-ego de Charles Bukowski.
quinta-feira, 21 de maio de 2015
quarta-feira, 20 de maio de 2015
Pinóquio no psiquiatra
A sala de espera era toda escura. Uma mesinha de certo era branca, com um rinoceronte cor de rosa bem no meio. Ele sentou numa poltrona que imitava um ovo aberto, sentou e esperou, esperou. O psiquiatra demorou para abrir a porta do consultório. Antes o paciente foi até uma das cortinas, abriu e olhou para a noite, as luzes, e para baixo. Então encostou a cabeça no metal da janela. Gelou. Quis tirar a testa dali, mas não conseguiu. Ficou grudado com os olhos fixos na luz de um poste que ressaltava as pedras em preto e branco da calçada em frente a um prédio. Um carro parou, uma mulher desceu. Estava vestida de preto e usava chapéu. Elegante. Ela então se virou repentinamente e olhou para cima, para ele e sua testa grudada na janela. Ela sorriu e dali ele jura ter visto o rosto de Marlene Dietrich no filme O Expresso de Xangai. Houve acenos de ambas as partes. O psiquiatra abriu a porta e o chamou. Ele desgrudou e entrou. No consultório olhou, como sempre, a figura de um pinóquio que ali havia. Depois, sentou e começou a falar. Não sabia se estava contando verdade ou mentira. Por isso estava ali.
terça-feira, 19 de maio de 2015
Sem farda
Tirou a farda pela última vez e deixou-a em cima da cama. Foi tomar um banho frio, colocou um calção e voltou para o quarto da casa onde morava sozinho. Olhou a roupa que o acompanhou durante boa parte da vida. Nunca mais iria usá-la. Cumpriu seu tempo da forma mais honesta e sensata possível. Não havia nenhuma marca no cabo de seu revólver que pendurou no lugar de sempre. Jamais atirou em alguém, apesar de terem atirado nele - sem acertar. Também seguiu a hierarquia, mas sem baixar a cabeça ou deixar de falar o que achava correto ou errado aos oficiais. Foi um soldado. Agora não era mais. A farda tinha o destino da doação a algum companheiro de polícia. Ele então a dobrou, colocou num saco plástico para mandar lavar no dia seguinte. Deitou, olhou o teto, agradeceu a proteção recebida durante tantos anos. Estava vivo e feliz com a missão cumprida. Também tinha a resposta certa se alguém perguntasse se não teve medo de morrer vivendo tanto tempo tão perto do perigo. "Nunca encarei a morte. Finjo que não conheço".
segunda-feira, 18 de maio de 2015
Cicatriz
Um dia descobriram que ele tinha uma cicatriz bem feia na perna. Parecia ter sido mal costurada, aquele fio de pele branca estava esgarçado - e quem olhava bem tinha medo de que, num esforço maior, aquilo ia se abrir e mostrar as entranhas do corpo naquela parte. Havia fotos assim, que ele mostrava com gosto para provar como era feio a parte de dentro do ser humano. Para os que perguntavam sobre a tal marca, ele dava respostas diferentes, dependendo da plateia. O que mais gostava de dizer era que tinha sido ferido cobrindo a guerra do Vietnã junto com José Hamilton Ribeiro, que perdeu uma parte da perna e cada vez mais se mantém como o melhor repórter no país. Dizia o da cicatriz que tinha lhe sobrado apenas um estilhaço da mina. Para outros, contava a verdade, pois um tendão rompeu, por fadiga de material, como dizem os mais velhos, e tiveram de abrir, fazer um enxerto, remendar e costurar. Ele gostava de contar essas coisas. Quando chegava em casa, ficava olhando a marca, enorme, de quase 30 centímetros, e encarnava no pensamento e em cenas de filme de guerra a mentira sobre o que tinha acontecido na selva. Depois, num esforço, conseguia entrar no último helicóptero que partiu do teto da embaixada americana em Hanói, na fuga do Império diante dos vietcongs. Era parte da história. A parte derrotada, com o rabo entre as pernas. Mas ele estava lá. Ou não?
sábado, 16 de maio de 2015
quinta-feira, 14 de maio de 2015
Paço
A palavra entrou e ele estranhou. Paço. Foi ao pai dos burros: residência de rei, solar de família nobre, sede do governo do município… Na janela viu a vaquinha pele e osso comendo o resto da ração de palma enquanto o bezerro tentava sugar alguma coisa das tetas deka. Um carro de boi passou tocando melodia na estradinha. A poeira levantou, ele fechou a janela e ficou ali matutando se tinha visto um paço quando foi um dia na feira da cidade. Não lembrou, mas se agradeceu por ter aceitado um dia o dicionário todo estoporado, como dizia, de uma professora que achou ele interessado nas letras. Fechou a casa, caminhou até o asfalto, se enfiou numa caminhonete que fazia lotação e desembarcou duas horas depois na cidade encravada no pé de uma serra que tinha lá no topo um Cristo de braços abertos e cabeça desproporcional ao corpo. Perguntou onde era a prefeitura. Indicaram. Foi lá. O prédio, antigo, ficava numa praça modernosa e tinha um número em cima da porta de entrada. Foi construído antes de Lampião ter apavorado o povo daquela região. Quis entrar no paço mas foi barrado. Imaginou que era porque estava vestido do jeito de sempre, ou seja, com calça e camisa rasgadas e impregnadas de poeira. Tentou argumentar com o segurança, um bicho do mato vestido de farda e se valendo do trabuco na cintura. Desistiu diante da recusa veemente, mas antes de retornar para o casebre do sítio, pensou como um repentista e disse no ato para o matuto: “Passo o paço e não me passo”. O outro só arregalou os olhos eivados de pequenas veias vermelhas.
quarta-feira, 13 de maio de 2015
Gás
Se acostumou ao cheiro de gás de cozinha desde que era bebê. A mãe, solteira, tinha um péssimo olfato e o botijão, com vazamento, ficava dentro do barraco – e ele ali, inalando, de leve, mas inalando. Cresceu sem saber disso, até que um dia houve o gás tomou conta da casa do vizinho, gritaram para todo mundo correr porque havia o risco de explosão. Ele nem aí. Tranquilo, entrou na zona de perigo, conseguiu fazer o reparo na mangueira furada, saiu sem tontura, e foi aclamado como herói do pedaço. Gostou mais do odor que sentiu e a sensação de liberdade causada do que a bajulação do povaréu. Comprou então um pequeno botijão, sem a mãe saber, nele adaptou uma máscara de oxigênio, escondeu a engenhoca embaixo da cama, pois sabia que o chão de terra batida jamais seria limpado, e toda noite inalava sua dose no meio da madrugada. Sonhava acordado. Depois tinha pesadelo dormindo. Num deles acontecia a explosão. Foi assim que foi parar na manchete do jornal sanguinolento. Dele, da mãe e do barraco não sobrou quase nada. O que intrigou os bombeiros e peritos foi aquela máscara intacta que abrigava em seu interior, grudados, os lábios e os dentes de alguém que sorria.
terça-feira, 12 de maio de 2015
Variado
Ele cismou - e pronto! Resolveu ter vários nomes na cidade onde foi morar já na idade madura. O que facilitou a pluralidade era o fato de frequentar locais bem distintos e distantes um do outro. No trabalho era fulano. No clube que frequentava nos finais de semana, sicrano. Nas aventuras amorosas era beltrano. Em casa se identificava pelo nome que constava na certidão de nascimento, cuja cópia ele ganhou dos pais e mandou ampliar do tamanho de uma parede do sobrado onde morava sozinho. No começo da história inventada ficou meio atrapalhado. Tinha de ficar ligado para atender aos chamados. Depois se acostumou. Viveu assim muitos anos, período no qual só raras vezes esteve para ver sua maluquice desmoronar. Fulano, Beltrano, Sicrano e ele mesmo nunca se envolveram com crimes ou deram golpes na praça. Um dia se apaixonou perdidamente por uma zinha. Em menos de dois meses ela aceitou o convite para morar com ele. Ao entrar no novo lar viu o documento na parede e ficou quieta, apesar de tê-lo conhecido como Sicrano. Ela viveu em paz com todos eles. Zinha tinha várias personalidades.
segunda-feira, 11 de maio de 2015
Teorema
O fuinha deixou o cabelo crescer para se parecer com John Lennon. Usava óculos de aro redondo. Mas era e tinha cara de árabe - e ajudava o pai numa loja de sapatos. Naquela turma, era rico, mas estudava num colégio público. Pão duro! Andava num carrão antigo que fazia sucesso entre as meninas. Um dia saiu com a mais linda de todas - e o vizinho de classe que a olhava e tinha medo de falar, apesar de ser correspondido, passou mais uma noite sem dormir e sofrendo. Até o dia em que uma professora falou a todos daquela classe de subúrbio de cidade grande sobre a necessidade da arte como porta para abrir os caminhos do conhecimento. Falou, em resumo, sobre o que valia a pena, ou seja, a própria vida sem as amarras, sem as viseiras, sem o engessamento, sem o embotamento - aquilo tudo que existia desde o primeiro dia de vida. Partiu então para a aventura num cinema de arte na praça do Centro, distante uma hora e meia no ônibus sacolejante. O que viu, até hoje não esquece. Não entendeu, mas sentiu. A pancada foi tão grande que cinquenta anos depois ainda aprende com Pier Paolo Pasolini e admira a longevidade de Terence Stamp. O Teorema, não decifrou, porque as relações humanas são assim mesmo - e é isso o que o faz achar a existência tão emocionante.
quinta-feira, 7 de maio de 2015
Na vida dos anões
Nunca tinha visto nas ruas da cidade até se encantar com "Também os Anões Começaram Pequenos", filme do diretor Werner Herzog. Era cinéfilo - e gostava de assistir tudo em casa. A internet facilitou seu trabalho. Baixava tudo. Mas a partir daquele filme começou a sair. A pé. Procurava. Queria saber se existia. Queria conversar, fazer amizade. Um dia viu um casal saindo de uma loja de eletrodomésticos no Centro da cidade. Apesar da timidez, tomou coragem, se apresentou e contou sua história. O casal nunca tinha ouvido falar do filme e muito menos do diretor alemão. Ele se comprometeu a levar o vídeo para a casa deles. Era uma forma de se aproximar. Eles aceitaram. Ele foi. Tão bem recebido que até demorou um pouco mais depois do fim da história. Comeu as broinhas de fubá que só conhecia nos contos de Dalton Trevisan. Adorou também. Estava emocionado e tão à vontade com nunca acontecera em sua vida. Antes de se despedir, falou sobre isso e chorou um pouco. O casal de anões pediu para ele voltar quando tivesse vontade. Antes de sair o homem da casa quis tirar uma dúvida. Perguntou se todos na família dele eram da mesma altura. Ele disse que não - a maioria era baixinha. Só ele atingira os 2,20m.
quarta-feira, 6 de maio de 2015
Sem cura
De Paulo Leminski
Leite, leitura
letras, literatura,
tudo o que passa,
tudo o que dura
tudo o que duramente passa
tudo o que passageiramente dura
tudo,tudo,tudo
não passa de caricatura
de você, minha amargura
de ver que viver não tem cura
Leite, leitura
letras, literatura,
tudo o que passa,
tudo o que dura
tudo o que duramente passa
tudo o que passageiramente dura
tudo,tudo,tudo
não passa de caricatura
de você, minha amargura
de ver que viver não tem cura
Trinca, trincando e desbundando
Chegou no manicômio algemado, só de cueca e no camburão da polícia. Os olhos injetados, babava pelos dois lados da boca. Não conseguia falar, dentes rangendo. Levaram-no para a unidade de desintoxicação, aplicaram sedativos, deitaram-no na cama, amarraram seus braços e pernas. Uma enfermeira grávida perguntou, depois de um tempo, se ele estava se sentindo melhor. Ele olhou e disse: "Trinca, trincando e desbundando". Ela estava acostumada àquilo. Só não gostava muito quando chegavam os alcoólatras que entravam em estado de delirium tremens - porque os bichos que viam os faziam urrar de pavor e ela achava que isso o seu bebê poderia ouvir e não gostar. Uma semana depois o trinca, trincando e desbundando já estava sóbrio e conversando com os outros pacientes internados. Contaram como chegou e o que falou. Ele tentava lembrar de todo jeito como aconteceu tudo aquilo, mesmo porque até a véspera do ocorrido nunca tinha colocado nenhum tipo de droga na corrente sanguínea. Era um careta radical. Então lhe veio a imagem da festa onde estava tomando água mineral e foi até a cozinha procurar algo para comer. Não achou e abriu a porta de um armário. Lá havia uma bandeja de prata e com um monte de pó branco em cima. Achou que era de comer. Pegou uma colherinha, encheu-a, colocou na boca e engoliu.
terça-feira, 5 de maio de 2015
segunda-feira, 4 de maio de 2015
Visita
Foi juntando todos os cartões de visitas que recebeu na vida. Nunca precisou olhar algum, mas, sem saber o motivo, colocava-os dentro de uma gaveta. Quando se deu conta, anos depois de lançar ali o primeiro, de uma gráfica cujos números de telefone tinham cinco algarismos a menos do que os atuais, o local estava abarrotado. Um dia resolveu fazer uma limpa, mas olhando um por um. Tentava resgatar na memória quem era a pessoa que lhe dera aquele pedacinho de papel retangular com nome, endereço, telefone, etc. Claro que não recordava, mesmo porque, para as mínimas coisas recentes, os neurônios já estavam falhando. Demorou uma semana fazendo isso, mas um dia um dos cartões o fez parar - e os olhos brilharem. Lembrou! Era o de uma casa de tecidos numa rua antiga de uma cidade grande. Havia um vitral ali dentro que o encantou. Era muito grande, ficava nos fundos da loja e, ao lado dele, uma escada estava grudada na parede. O vendedor disse que era exatamente para quem, como ele, se maravilhava. E o convidou para subir e olhar através daquela obra de arte. Foi o que fez até chegar a um ponto onde podia olhar através de uma flor que a mão de uma mulher segurava. Foi então que viu uma santa que encimava a cúpula de uma igreja que ficava ali atrás, mas ele nunca tinha reparado. A imagem olhava exatamente para aquele ponto do vitral. Ele fez o sinal da cruz e, anos depois, guardou apenas aquele cartão para sempre.
sexta-feira, 1 de maio de 2015
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