segunda-feira, 5 de outubro de 2015
Na paisagem
Quando vejo alguém falando em pragas que assolam o Planeta, fico puto. A praga maior, a que originou todo desequilíbrio e fez desencadear todas as outras, não é citada. Ele escreveu isso sob a luz de uma lamparina, com caneta Bic escrita fina, tinta quase no fim, em papel de embrulho amassado. Foi dormir pensando nisso. Morava num deserto onde, de dia, esquentava a mais de quarenta graus. Na primeira vez que esteve ali, vindo do Sul, onde nasceu, havia muita mata, muitos pássaros, muitos bichos. Depois de anos teve de se entocar na casinha que os pais deixaram, pois uma confusão terminada em sangue o obrigara a fugir, a se esconder. Aí já não encontrou mais nada - nem o pasto, a primeira praga. O açude secou, os bichos sumiram de morte morrida ou matada, os povos se arretirou, como falavam por lá. Ele ficou porque já não tinha forças nem ânimo. Andou ,muito por aqueles lados e viu o uso de herbicidas, viu o assassinato da terra, viu a morte em várias versões, e viu a maior praga, que era como no sul, onde morava em favela: o homem, a espalhar a doença e transformar tudo em amebas pestilentas. No dia seguinte guardou o papel com carinho. Pensou em pedir para alguém o colocar em seu caixão. Talvez pudesse apresentar sua descoberta lá do outro lado, para o todo poderoso. Quem sabe... Mas aí achou que a fome estava fazendo-o delirar demais. Rasgou o que escreveu e ficou olhando a paisagem esturricada.
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