quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A cama da foto

Era adolescente quando se apaixonou por fotografia. Na verdade, a magia que o encantou era mais antiga, pois foi com sacrifício que pagou todas as mensalidades do Baú da Felicidade e conseguiu tirar uma maquininha de plástico que tinha o singelo nome de Tuka. Mais tarde teve a sorte grande ficar com uma maquinona emprestada por um funcionário da indústria automobilística, a fantástica Nikon F, que era usada por dez entre dez profissionais da imprensa e artistas em geral. Passou um dia com ela, quando fez aquela foto que nunca mais esqueceu. A cama de solteiro, toda desarrumada, ficava embaixo de uma janela - e a luz que ali penetrava foi perfeita para o claro/escuro eternizado no filme Kodak TRI-X e na cópia de papel. Não havia mais nada, apenas aqueles lençóis e um travesseiro que quase não aparecia. Quarenta anos depois ele achou a foto dentro de um livro, já amarelecida. Ficou olhando, olhando e descobriu que toda aquela confusão, aquelas dobras, tudo enfim, lhe apareceu como um presságio do que seria a sua vida durante muito tempo. Pensou nisso e sorriu. Mesmo porque, depois de velho, aprendeu a arrumar os lençóis  e dobrar as colchas assim que se levanta.

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