terça-feira, 12 de novembro de 2013
O Fenemê disse alô
Era do tempo em que telefone se chamava macaco. Porque todos eram pretos. E grandes. E pesados. Armas usadas em alguns assassinatos passionais. Ele guardou um em casa, porque os filhos achavam demais enfiar o dedo nos números para discar um por um. Também diziam que era um absurdo sustentar aquele peso para dizer alô. Escondeu o macaco num baú e viu a telefonia brasileira chegar na era digital e o escambau. Resistiu o quanto pode a ter um aparelho celular. Mas quando o de linha foi colocado no lixo que não é lixo, achou que deveria ter um. Para falar com os velhos amigos que ainda estavam vivos. Para recordar - porque, como disse o Gabriel, aquele, é preciso viver para contar. As teclas eram minúsculas e ele não enxergava os números. Trocaram por um de tela e ele se atrapalhava todo. Tanto que o manuseio interferia até no problema da próstata que o fazia ir ao banheiro duzentas vezes ao dia para o alívio do xixi sagrado. Cansou mijar na cueca, calças, bermudas e levar esporro da mulher, velhinha mas pentelha como sempre. Um dia olhou aquela tela acesa por um toque e resolveu acabar de vez com a relação. Foi até uma avenida perto de onde morava e colocou discretamente o aparelho no asfalto. Ficou olhando da calçada. Teve sorte. Passou um caminhão enorme em cima. Ficou muito feliz, principalmente porque o bichão era um Fenemê do seu tempo.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário