quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Parabólica no inferno

A um dia de viagem entre Manaus e Belém pelo rio Amazonas, ele desligou o motor do barco e achou que estava tendo um delírio naquela imensidão. Na faixa verde da floresta um barraco de madeira, cinza, se destacava. Mais que a solidão daquela casa, o que chamava atenção era uma enorme antena parabólica branca encravada bem ao lado, com bocarra aberta na direção do espaço. Ele então foi até lá, encostou a embarcação num barranco e caminhou até a porta da frente. Estava fechada, assim como as janelas e as outras portas. Bateu palmas, socou a madeira, gritou. Nada. De repente ouviu um rangido e a porta se abriu vagarosamente. Ele entrou com o coração aos pulos. Tudo estava escuro, menos um dos cômodos, onde uma luz tênue tremelicava. Ali havia apenas uma poltrona onde viu o tampo grisalho da cabeça de alguém e, na frente dele, um aparelho de tv ligado. Um braço se levantou e pediu para ele chegar mais perto. Obedeceu. Era um homem com a pele tão enrugada que era difícil distinguir os traços do rosto. O velho pediu para ele sentar ao lado. A voz era um fiapo de som - mas rouca. Ele sentou. De repente o homem apontou para a tela e disse: "Viciei nisso há muito tempo. Não durmo mais. Tudo que passa aí para mim é fantasia. Substitui o sonho, seja bom ou pesadelo. Acho que isso é coisa do Diabo - e com o Cramunhão não se pode lutar".

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