terça-feira, 19 de agosto de 2014

Cavalar

Os cavalos começaram a entrar na vida dele quando ainda era bebê. Olhava do berço a imagem do anjo protetor e fazia associação com o trotar do cavalo da carroça que distribuía leite em garrafa no bairro. Essas associações malucas continuaram durante toda a vida dele. Ninguém se importava, pois era era um gênio para o resto das coisas, inclusive o ensino. Foi a Harvard e voltou um mês depois dizendo que aquilo parecia colégio de subúrbio. Sim, tinha espírito de grandeza. O anjo não o acompanhava mais, porque ele disse um dia que tinha matado Deus – e ficava puto quando alguém dava este crédito a Nietzsche. Resolveu se isolar. Comprou uma fazenda no interior do Paraná com o dinheiro que ganhou em jogos de azar. Azar dos que ele limpou, porque descobriu uma fórmulas de burlar qualquer parada no carteado, porrinha ou jogo de dados. Os cavalos estavam lá, no pasto. Resolveu comer junto. Alfafa e grama. No segundo dia já estava acostumado ao gosto. Sozinho, com vizinhos a quilômetros de distância, queimou as roupas e passou a andar nu e de quatro. Um dia tentou seduzir uma égua. Levou um coice. Morreu com uma marca de ferradura no meio do peito. Antes de apagar definitivamente, ouviu um relincho – e viu novamente o anjo.

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