terça-feira, 30 de junho de 2015

O poço

O mistério do poço era o poço. E o balde. E a corda. E tudo desaparecendo naquele buraco. O menino olhava a mãe sair do casebre com a bacia de alumínio, deixá-la no chão, tirar aquela tampa de madeira, destravar a manivela e descer o balde cinza, de metal, cuja alça estava com a corda amarrada bem no meio - e que antes de desaparecer sempre balançava mesmo sem vento, sem nada. Depois tinha aquele barulho que mais tarde ele ouviu na voz de Luiz Gonzaga, mas no caso era a caneca entrando na água quando ele voltou ao nordeste e levou uma chamada de Januário. Tibung! Aí ele via a mãe com a mão esquerda segurando "os quartos", como ela dizia, e enrolando a carretilha grande, fazendo força, até aparecer o balde chorando. Ela o tirava na mira do buraco e depois despejava a água limpa na bacia, que levava pra dentro. Naquele dia o menino reparou que a mãe esqueceu de fechar a tampa do poço. Ele foi lá olhar. Se esticou até conseguir ver tudo - e era escuro, e parecia que um monstro iria sair dali e puxá-lo. Mas ele olhou direito e viu, lá embaixo, no fim do mundo, um pedaço do céu e algumas nuvens que estavam acima dele, pois olhou para verificar. E aí se viu naquele espelho. Era uma cabecinha de alfinete. Quis saber também se podia aparecer  a mãozinha dando tchau. Apareceu. E as duas, daria? Deu. E aí foi sonho ou pesadelo porque sumiu tudo que o amparava. Lembra que escutou um grito. Depois, ainda tonto, um braço segurando seu corpo e ele subindo na corda até os olhos se ofuscarem com a luz do sol. Ouviu gente rindo, chorando, foi abraçado, beijado, tudo mais. Falaram em milagre e ele foi colocado na cama depois de tomar banho quente. Foi assim que o mistério do poço aumentou muito mais para ele.

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