Maria morava sozinha em dois dos cômodos daquela casa que, dividida, abrigava toda sua família. Os filhos e filhas casados e netos. O marido há muito tinha morrido. Os vizinhos nunca o viram. Havia um mistério ali, porque o que se comentava é que tinha sido morto na guerra. Maria era iugoslava. Ninguém sabia o sobrenome, mesmo porque provavelmente não saberiam pronunciar. Maria usava vestidos compridos e estampados, mas sempre discretos. Era uma mulher grande, de cabelos longos, lisos, grisalhos, sempre enfeixados numa longa trança. Era amada por todas as crianças do local. Porque ela tinha uma paixão antiga e fazia questão de passar isso para a garotada: o cinema. Todo domingo, durante anos, Maria reunia todos no início da tarde e os levava para assistir a matinê no cinema do bairro. Fez isso sempre, como um ritual religioso. Quando foi embora, àqueles meninos e meninas parecia que ela tinha entrado na tela e desaparecido antes do the end. Ficou a paixão para muitos deles. E até hoje, no escuro das salas nos shoppings, eles continuam no encantamento e dona Maria sempre está presente.
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