quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014
Bacia de pecados
Acordou e sentiu que algo apertava o tornozelo na perna direita. Puxou e só sentiu dor. Foi olhar e viu que estava amarrado a uma bacia gigantesca onde revia vários episódios do passado. Todos ruins e que lhe feriam o coração. Mas se antes eles vinham de tempos em tempos, de leve, ali, não! E como na tela de tv, havia entre um capítulo e outro uma espécie de propaganda. Letras luminosas piscavam e ele lia, mesmo sem querer: culpa, culpa, culpa. Achou que sonhava, olhou em volta e não havia mais quarto, não havia mais móveis, não havia teto ou piso. Só a cama onde estava deitado - e aquela bacia. Quantos erros, quantas cagadas, quantos ferimentos distribuídos em quem estava perto ou longe... E aquilo acontecendo logo agora! Logo com ele, que achava ter se redimido, que vivia tranquilo há muitos anos, que imaginava ter se descoberto depois de velho... Então aconteceu: um letreiro reluzente e móvel, como os das fachadas das sedes de jornais, ordenou: beba! Ele pegou a bacia - e ela não tinha peso nenhum. Colocou a boca aberta na borda e virou. Tudo entrou para dentro dele num flash. Então sentiu sono e dormiu. Ao acordar o quarto estava como no dia anterior. Notou que se sentia muito leve e tranquilo. Então sorriu ao entender que não podia mudar nada do que tinha feito - mas sim do que ainda ia fazer.
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