terça-feira, 10 de novembro de 2015

Redemoinho

Não abriu a boca. Sabia que havia alguma coisa ali dentro, mas ficou quieto. Pensou que estava ficando adulto, aos 70, porque um dia alguém lhe disse que o papo de ser menino era desculpa. Ele nunca se livrou dos medos de criança. Nem das alegrias, que carregava em caixas cheias de bolas de gude, piões, carrinhos sem rodas, aviões de lata. Adulto. O redemoinho que sentia bem abaixo do peito o fez lembrar fotos de furacões feitas de satélites e apresentadas nos horários nobres dos telejornais. Lá vem! Boca fechada. Não sabia o que estava lá dentro porque a mente não conseguia decifrar. Olhou pela janela e viu a luz amarela pendurada num poste. Um vento frio invadia o ambiente. Sozinho. Era melhor assim? Não, não sabia de nada, apenas que era aquilo, no momento - e que tinha de passar. Um cachorro latiu na rua. Outros responderam. Veio uma dor, ele abraçou a própria barriga e se curvou. Pai, mãe e filhos que olhavam de fotos penduradas na parede se preocuparam. Ele deitou no chão e a posição fetal foi inevitável. Veio um choro sentido, convulsivo, como se para pagar todos os pecados do mundo. Sozinho. Sete imagens do Espírito Santo dentro de capelinhas de madeira observavam em silêncio no canto de uma estante. Então conseguiu pensar em algo. Aquela era a dor do ser humano. O redemoinho sumiu. Ele se esticou e levantou. Estava salvo. Por enquanto.

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